Alma Nova 09 - Iniciativa Prateada

Os escombros da montanha voam como se atingidos por um explosivo, mas era apenas Moses, levantando pedras com seu golpe, Asterion somente tentava detectar um resquício dos cavaleiros mortos com seu poder telepático, aliado à técnica natural de detectar cosmo de qualquer cavaleiro e Marin apenas rezava para Athena que seu irmão não estivesse morto, ou mesmo que a própria Athena não estivesse morta.

-Ei, Asterion! Achei um deles! - Até que finalmente, um dos corpos foi achado. O corpo da Amazona de Andrômeda sozinho.

-Não parece ser uma posição de quem morrera em batalha, mas sim de quem morrera fugindo. – Asterion comentava olhando o corpo, e sentindo mesmo a cosmo energia da armadura, que também estava morta. – Acho que ela já devia estar bastante ferida. O que acha, Marin?!

A amazona estava estática, parada como muitas vezes naquele dia, era como se não encaixasse algo em sua cabeça. Asterion sente uma confusão nas nuances de suas emoções e ela parece finalmente acordar de seus pensamentos, e confirma que esse era um dos traidores, uma amazona de bronze vinda da ilha de Andrômeda.

-Se ela estava fugindo, significa que estava vindo dali, o centro de batalha que devia ter sido destruído. –Marin apontava para a direção oposta onde o corpo fora encontrado e já caminhava nesta direção.

Moses a seguia até que de repente foi detido por Asterion.

-Não acha que pra uma investigadora introspectiva indagadora, ela não está solícita demais?! –Asterion não precisava e nem dependia demais de suas habilidades mentais para interpretar as nuances de humor humanas. Ao contrário de muitos outros telepatas que se consideram acima dos humanos, querendo se livrar de sua humanidade, ele era apegado demais a sua. Por ser humano, ele entendia as mudanças humanas, principalmente aqueles com uma força de vontade que impedia a aproximação de sua mente. Isso explicaria sua vinda especificamente para essa missão.

-Você é o telepata, mas se você estiver pensando o que eu estou, ela é minha. –Moses era um companheiro de longa data do cavaleiro de cães de caça. Não era um gênio e nem um prodígio, mas não era um acéfalo que pensava apenas com os músculos, tinha inteligência bélica. Cada cicatriz que possuía no corpo era uma lembrança de como ele escapou da morte diversas vezes. Ele quando conhecia alguém, já estudava seus atos e fazia um combate mental entre os dois, como um mero exercício mental. Tanto que fizera isso também com Asterion em cada missão junta. Não que ele fosse um inimigo, mas por via das dúvidas...

-Como sempre. –dizia Asterion.

Ambos caminhavam na direção onde à amazona de prata havia se dirigido.

******

Misty era um homem belo, possuía a pele alva e sem uma cicatriz, sua pele chegava a se destacar na noite, como se ele fosse iluminado. O cavaleiro de prata passara mal por dividir o transporte com Moses, que contava com orgulho cada história de cada cicatriz. Para o cavaleiro, não havia beleza e nem mesmo lucidez em criar ferimentos, derramar sangue no solo e contar isso com orgulho. Isso na verdade era uma fraqueza, a sua incapacidade de deter ou escapar do ferimento.

Na concepção do cavaleiro de prata sair vitorioso de uma batalha era o sinal que você era o melhor, mas sair ileso era o sinal que você era abençoado, iluminado, o escolhido. Sair sangrando era o sinal que o seu inimigo maculava seu corpo, sua ideologia, sua existência.

Ainda bem que seria simples, apenas recuperar uma armadura perdida em uma floricultura, o que era irônico, afinal, ele era dito como afeminado pelos cavaleiros que teciam comentários sobre a vida alheia em vez de aprimorar seus corpos. E era uma missão fácil, na pior das hipóteses era enfrentar um rebelde de bronze ou matar um civil, porém se tratando de um artefato daquela magnitude vidas podiam ser perdidas, e era tolerável. Não agradável, mas sim, tolerável.

Era noite e todos estavam em suas casas. Ao que parece houve um acidente da natureza ou uma aparição de um cavaleiro, se bem que ambos eram iguais, apenas que o segundo acontecimento geralmente era camuflado como o primeiro. Os cavaleiros eram forças da natureza invisíveis que simplesmente aconteciam. Só que ao contrário da natureza eles obedeciam à justiça. Ou aqueles que se diziam a mesma...

Depois de se perder por diversas horas e apenas seguindo um mapa, havia encontrado. E o lugar era lindo. Não era grande, não era ostentosa, não era opulenta. Era simples, deixando apenas as flores não só como decoração, mas algo vivo, como se elas realmente morassem na loja de dois andares. Era um verdadeiro tributo a deusa Perséfone.

Passa da meia-noite, e Misty se aproximava da porta que tinha uma enorme janela. E já não gostara, sentia um resquício de cosmo em suave. Pensara no começo que era a influência da armadura, a ressonância de seu cosmo, mas não era. Não era constante e nem natural, tinha oscilações bem forçadas. Era óbvio que aquele era um cavaleiro, e bem treinado para esse nível. E a porta estava aberta, na verdade estava arrombada, a maçaneta estava deslocada violentamente e de maneira precisa ao mesmo tempo.

Ele abria a porta e seu olfato era invadido por diversos cheiros florais, que não eram desagradáveis, mas o deixava entorpecido por diversas sensações sutis. Ao fundo aparecia a silhueta de um homem. Forçando a visão via mais um japonês, com cabelos enormes lisos e negros que se confundiam com a escuridão do local, porém com trajes típicos de outro lugar que o cavaleiro de Lagarto não reconhecia no momento, e possuía bandagens nos olhos, provavelmente era cego.

-Desculpe senhor, a loja está fechada no momento. –dizia o cego, esbarrando na mesa desastradamente, deixando cair um vaso com Crisântemos.

-Desculpe senhor, mas vim buscar uma encomenda. –Misty sabia que ele não era um dos Harusuki, até porque lera e relera o relatório da missão e a única Harusuki viva era uma tal de Hana. E era uma jovem, e não um jovem cego, mas queria ver até onde aquele teatro fajuto iria.

-Acho que não tem nada para o senhor aqui, melhor o senhor ir embora. –O jovem cego dizia com uma voz poderosa, séria e sóbria. E se acostumando com a iluminação, Misty via que o corpo do cego era calejado de treinamento, era no mínimo um cavaleiro de bronze ou um agente do Santuário muito poderoso, mas nada que um cavaleiro de prata pudesse dar conta.

******

No orfanato Filhos das Estrelas, Shun olhava pela janela de escritório. Depois de acompanhar pela televisão todo o desmoronamento do topo do monte Fuji, só havia agora debates sobre isso em todos os canais, muitos culpavam o aquecimento global por causa do degelo que provocou a avalanche, outros culpavam o choque das placas tectônicas que sempre aconteciam e os mais conspiradores achavam que era um ataque terrorista da guerra do ocidente com o oriente médio. Mas não, tantos estragos eram causados por uma deusa pagã ressuscitada, que era uma de suas melhores amigas, e de seus servos místicos que protegem esse mundo.

Era muita insanidade todos esses acontecimentos aparecendo todos de uma vez, e o pior era que ele não poderia dizer nada, afinal quem iria acreditar. Provavelmente falariam que estaria louco, e tirá-lo-iam da administração do orfanato. Deixando provavelmente o lugar uma mansão abandonada no nome do único dos bastardos Kido que o velho assumira, o qual era um aventureiro e sumiu pelo mundo.

Pensava que no mínimo poderia contar essas histórias para as crianças, ou mesmo não. A mente de Shun continuava a vagar, pensando. E se um dia todos soubessem dessa verdade? Que na verdade o Islamismo, Cristianismo e diversas religiões estavam erradas, e que a verdadeira era uma religião morta há muito tempo? Que todos lutaram, morreram e viveram, por uma ideologia falsa? E imaginar que jovens de mesma idade que a sua tem um poder destrutivo de exércitos e que cada nação guerrearia para dizer que “Athena” estaria do seu lado, criando seus próprios “cavaleiros”. Imaginava o Papa e Hana, discutindo sobre filosofia e quem estava certo. Ou mesmo pior, numa época de terrorismo e guerras acusar Hana de ser uma “inimiga publica”, com seu pequeno exército capaz de devastar cidades.

Era bizarro demais, por mais que escondessem, provavelmente isso não iria durar para sempre. Por mais que ocultassem os fatos, culpando outros, não iria durar pra sempre. Era difícil pensar nisso, toda essa informação que aquele garoto ruivo lhe passou foi demais. E ao que parece, dessa vez ele presenciaria essa luta, e o garoto que deveria ter seus treze anos estava no portão do orfanato, esperando a pessoa que viria os matar. E tudo que o jovem diretor poderia fazer era observar. Todos estavam em uma excursão, inclusive Minu que foi como responsável. Ele também poderia ter ido, mas algo o pediu para ficar e ver. E ainda havia uma chance da casa ser destruída, e aquele era seu lar, se fosse destruído, ele morreria junto.

Por fim, esperava que os quatro cavaleiros e sua amiga Hana estivessem vivos e que se recuperassem, seja qual fosse o mal sofrido por eles.

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O jovem ruivo tinha um corpo calejado, mas olhos curiosos e imperativos, que fitavam a rua em frente ao orfanato e possuía dois pontos bem formados na testa de um lilás muito claro. Estava lá após ter comido muito no orfanato e ter discursado sobre dez por cento do que eram os cavaleiros do zodíaco e a situação atual para o diretor, afinal, ele o tratara bem e o alimentara. Era razão suficiente para ele ter aberto sua mente, afinal por ajudar seu mestre, agora ele estava correndo perigo.

Honra e o certo a se fazer, preceitos básicos (ou pelo menos deveriam ser) aos cavaleiros de Athena; mas nem tudo eram as histórias e lendas que eram passadas de geração em geração. Os cavaleiros eram simplesmente humanos, com suas aflições, vícios e loucuras. Por mais que todos fossem santos, ou dito como santos, até santos eram humanos.

E o ar que era frio e úmido começava a se tornar quente e seco, era sufocante mesmo para aqueles que não tinham a mínima noção do que era Athena, e para o jovem de cabelos rubros e revoltos era clara a fonte dessa “massa de ar”, que não era um fenômeno da natureza, mas sim um cavaleiro. E não um sem-armadura ou mesmo um dos fracos. Ao que parecia, o Mestre do Santuário estava disposto a eliminar toda e qualquer resistência, mesmo que isso fosse matar bebês e criança.

E eis que ele aparecia...

Uma pessoa enorme e treinada na arte de combate dos cavaleiros era possível se notar só pelo olhar daquela pessoa. Era com certeza um cavaleiro, e do tipo fanático, que segue ordens sem pensar, apenas exaltando o orgulho por sua fé. Era um homem medonho, pois o fanatismo saltava aos olhos. Passos decididos, olhando com desprezo para o orfanato. Este com certeza iria queimar se o jovem não detesse aquele fanático.

******

Babel foi criado sempre dentro do Santuário. Foi filho de servos de cavaleiros de ouro, sempre se orgulhando por servir, mesmo que indiretamente a Athena. Sabia a história completa de cada geração de cavaleiro, desde as três ultimas guerras santas. Olhava cada estrela torcendo para que um dia fosse escolhido por Athena para defender seus preceitos.

Havia completado o treinamento que todos os guerreiros e soldados fazem; e mesmo após a morte dos pais continuava tentando. Até que foi sagrado cavaleiro de prata de centauro. Foi a maior emoção, sagrado pelo próprio Grande Mestre Ares, o qual ele mesmo deve a vida e jurou seguir sua palavra como lei, não importando o que fosse, mesmo se houvesse que tirar sua própria vida.

E ele estava lá, estando prestes a incinerar um orfanato cheio de crianças, e não tinha a mínima crise de consciência. Afinal, tudo fazia parte de um plano maior que Athena e as estrelas traçaram. Todos eram traçados por algumas estrelas, aquelas crianças apenas nasceram para serem incineradas, meramente, era assim que sua mente funcionava, incinerando sua consciência, humanidade e mesmo suas culpas.

Andando calmamente, encontrara o seu alvo, uma mansão enorme feita de madeira, concreto e tijolos, na mente de Babel, uma verdadeira oferenda as suas chamas e à Athena. Reconstruir um novo mundo a partir das cinzas do velho. Até que encontrara um garoto sentado em frente à porta, com cabelos ruivos revoltos e olhos extremamente curiosos. A primeira oferenda.

*******

Já na Grécia, no mítico lugar onde os cavaleiros do zodíaco tem como base de operações, o lendário Santuário de Athena, mas precisamente no Salão do Grande Mestre. O coração do Santuário, onde as acomodações de Athena se localizam também, um lugar onde poucos possuem acesso, apenas conselheiros, soldados de honra, auxiliares e os cavaleiros de ouro, e todos com sua devida permissão.

Estavam a sua Santidade, Mestre Ares ao lado direito da divindade que se dizia Athena. E a frente deles, dois seres que não podiam se chamar simplesmente de pessoas, dois protetores das casas zodiacais, dois cavaleiros de ouro ajoelhados perante o sumo-sacerdote e a sua deusa.

O primeiro a chegar foi Aldebaran, o cavaleiro protetor da segunda casa do zodíaco. Um homem enorme em todos os sentidos, claro que havia cavaleiros maiores, mas não mais poderosos. Um homem de feições duras e quando sem obrigações, um homem de um riso extremamente fácil e com uma extrema preocupação com as pessoas a sua volta. Um cavaleiro de caráter e coração perfeito para ser um dos supremos protetores de Athena.

E seu companheiro que estava ajoelhado ao seu lado, não era nada mais nem nada menos que Kamus, o cavaleiro protetor da casa de Aquário, conhecido fora da redoma que os cavaleiros de ouro se mantinham hierarquicamente como “Mago do Gelo”, devido as suas habilidades de manipulação de gelo superior a de qualquer Guerreiro do Ártico, e até mesmo por todo ar de sobriedade e nobreza que o francês carrega como personalidade. O mais racional das doze casas.

Ambos ajoelhados humildemente, perante aos representantes máximos da justiça a sua frente. Sendo apenas agentes da vontade de Athena na terra e o Grande Mestre Ares.

-Sem bem vindos e abençoados cavaleiros de Touro e Aquário, infelizmente não os chamei aqui para um momento de cortesia, mas sim para anunciar somente a vocês que estamos em uma guerra aberta agora. –Ares era preciso em cada palavra, pois em uma época com a que ele vivia, bastava apenas uma palavra errada para que a semente da dúvida germinasse na certeza do teatro do qual ele fazia. –Os traidores espreitam por todos os lados, que talvez nos leve a uma anarquia a nossa confrataria ou mesmo a matar nossa deusa. E vocês, Kamus e Aldebaran, são grandes opostos entre si, mas com algo equivalente, a justiça em suas almas. É com pesar que eu tenho que mandá-los como executores para alguns traidores.

O brasileiro e o francês se enaltecem com as palavras do grande mestre e estremecem com a noticia de serem executores, eles já souberam que o próprio Shaka, foi enviado para o Japão para eliminar cavaleiros negros e dizem ainda que ele afundou a Ilha da Rainha da Morte durante sua trajetória, causando ondas gigantescas, que provocaram em curto prazo a destruição de alguns vilarejos litorâneos, fome, doenças, dentre outros. Shaka estava tão ligado a sua proximidade com os deuses que se esquecia da sua proximidade com os humanos.

-Até mesmo enviaria Shaka novamente, mas lhe falta o senso que vivas não são apenas carmas que as pessoas estão destinadas a continuar sua jornada, mas sim alguém que devote sua vida a proteger as pessoas no plano material, claro que nossa função é lutar contra qualquer tipo de ameaça, mas ainda servimos aos humanos que não tem poderes para se defender. –A força e sinceridade das palavras de Ares tanto o assustou, quanto assustou Eris, não parecia Ares, a voz e a ideologia de Saga, as palavras foram tão fortes que até mesmo aos cavaleiros ajoelhados foi tocante, e nem mesmo pelas palavras em si, mas sim pela força e obviedade da voz. –Então, necessitamos que vocês eliminem essas potenciais ameaças, para até mesmo evitar uma guerra interna desnecessária de irmão de armas, e defensores de Athena morrendo por causas inúteis.

E para os cavaleiros isso era verdade, não suportavam guerras, para Aldebaran a própria palavra guerra era insuportável. Com a guerra vinha o caos, o medo, o terror, a angustia, dentre outros males humanos que afloram o pior do ser humano. E Kamus achava que isso era à volta dos primórdios do barbarismo, que toda evolução humana era jogada por terra.

-Agora meus amados cavaleiros peguem suas missões santas e vão em meu nome purificar esses maculadores de armaduras. Levem o significado de justiça a eles, levem o significado de Athena aos seus corações profanados. –Eris motivava com as palavras certas, com a tonalidade certa, com a delicadeza certa ao coração dos guerreiros áureos. A jovem deusa da discórdia tinha esse poder de convencer, de fazer guerras apenas por amor, um amor falso, ou mesmo palavras saborosas feitas de puro veneno. Um veneno que corrompia a alma de maneira lenta e eficaz. O exemplo disso foi Gêmeos ter se tornado Grande Mestre.

Os cavaleiros assentiram e respeitosamente saíram sem falar entre si, deixando novamente a deusa e o sumo-sacerdote sozinhos, acatando as suas ordens. Ambos sabiam que havia algo errado, ambos de maneira diferente, mas ainda sim sentiam que algo não se encaixava. Kamus sabia que não havia um manifesto muito claro para os traidores se rebelarem, há não ser que soubessem algo que o traidor Aioros iria fazer com a morte de Athena. Já Aldebaran só sentia que algo não se encaixava, afinal, todos os cavaleiros eram escolhidos por suas armaduras e constelações a servir à Athena. Era difícil entrar a idéia de “cavaleiros traidores”, mesmo a idéia de Aioros ter tentado matar Athena lhe soava absurda, mas naquela caça às bruxas, o melhor que fazia era ficar calado, não queria ter o mesmo fim de Aioros, matando ou morrendo por quem foi já seu amigo.

Ambos cavaleiros guardavam o que achavam errado para si mesmo, dentro de seus corações e trancados em suas mentes. E fechavam a enorme entrada que dava ao salão da divindade da Justiça.

-Podem sair agora. -Eris, com a mesma voz doce que sibilara para Aldebaran e Kamus ordenava de maneira sutil agora para as duas figuras que se ocultavam naquele lugar. O primeiro tinha um sério ar de despreocupação, recostado em uma pilastra de maneira desrespeitosa, como se não tivesse apego por nada, por religião, conduta ética, nada. Esse era Máscara da Morte, o sinistro guardião da casa de câncer. E do lado oposto, contrastando com a figura fúnebre, estava Afrodite, em sua beleza andrógena e ar de nobreza que parecia rivalizar com a essência divina de “Athena”. Era no mínimo hipnotizante.

Assim como os dois cavaleiros que acabavam de sair, eles se encontravam em um antagonismo amistoso, quase com uma guerra prestes a acontecer, mas que nunca acontecia. Era quase assustador que entre as doze casas, pessoas tão poderosas e tão divergentes vivessem sobre ordens de uma jovem e um velho.

-E então, o que quer conosco, ò vossa Santidade. –dizia Máscara da Morte com seus olhos que pareciam adagas prestes a perfurar o flanco de quem o olhasse diretamente, enquanto Afrodite era indiferente sobre qualquer assunto, como se não valesse a pena discutir com quem quer que fosse.

-Desculpem-me por convocá-los nas sombras de Kamus e Aldebaran. –dizia Eris descendo alguns degraus do qual seu trono era distante do chão.

-Sim, sabemos como somos desprezíveis, mal-falados e bastardos inglórios que não devem ser misturados com os de coração puro-. Os comentários do canceriano faziam, até mesmo que involuntariamente, Afrodite rir. Seu sarcasmo agressivo era uma verdadeira afronta a quem fosse sua vítima. Numa época daquela, ele seria condenado por traição facilmente.

-Muito pelo contrário, eles que não podem ser misturados a vocês. –Eris novamente destilava seus elogios e enaltecimentos que ludibriavam aqueles que não possuíam uma força de vontade pétrea e firme. –Vocês realmente são puros, vocês se assumem do jeito que são, não importando quem os olhem. Vocês são simplesmente vocês e eu admiro isso.

Afrodite já estava enredado pelas palavras de Eris, mas Máscara da Morte não se importava com as palavras doces que aquela ninfeta poderia dizer. Não iria rastejar aos pés dela como todos os outros faziam, ainda possuía um pouco de dignidade e orgulho, mesmo que decadentes, mas como ele decidira há muito tempo que nunca mais iria fazer o que achava que deveria e sim simplesmente acatar ordens, ele era apenas um instrumento da “justiça”, e não um filósofo.

-Apenas fale, vossa divindade. –Máscara da Morte tinha um engasgo cada fez que fazia reverência ao casal. –Não tenho a mínima disposição de apenas ser adulado. Se fosse, eu seria mais popular ou benevolente.

Eris tentava ler o coração de Máscara da Morte, mas não era possível, era tenebroso demais, um labirinto de sentimentos acumulativos e negativos, como desprezo, rancor, ódio, amargura, dentre outros. Um turbilhão de coisas que escondiam uma verdade ainda pior que aqueles sentimentos. Assim como Afrodite, que tratava tudo superficialmente, mas escondia algo que assombrava sua alma, o sueco era como uma arca de ouro cravada de pedras preciosas que apenas servia para lacrar um demônio.

Ambos achavam que o demônio que carregaram era pior que os demônios que viviam assolando a Terra, tornando-lhes seres maquiavélicos, que cumpriam ordens. Pois sabiam que o mundo não era uma lenda bonita que os mais velhos contavam aos mais novos. Que a diferença do bem e do mal era menor que um fio de cabelo, prestes a se romper. E que tudo era relativo, bondade ou maldade, justiça e injustiça, caos e ordem. Era óbvio para os dois apenas manter suas convicções e seguir em frente, ocultando e enterrando suas origens.

E Ares apenas observava o fracasso que era manipular o italiano com a alcunha fúnebre.

-E qual seria o porquê de toda essa hostilidade comigo? –Eris desejava saber o motivo da sua resistência, o porquê de suas palavras não o seduzirem e nem o conduzirem da maneira que sempre conduzia. Ele não tinha uma fraqueza aparente, a sua estava enterrada. Literalmente.

-Você pode lamber a pélvis do meu ego, mas nada disso não vai tornar meu trabalho agradável. Você é a justiça que eu sigo até encontrar uma melhor. –Máscara da Morte pegava os dois despachos da mão de “Athena”, um ele lançava para Afrodite e se dirigia para outro enquanto ia embora deixando o salão do Grande Mestre abrindo o despacho oficial. Ares por sua vez, já se manifestava para repreendê-lo, mas Eiri o impediu dizendo que ele era “espirituoso”, e Afrodite se desculpava pelo desrespeito perante a deusa pedindo para punir o cavaleiro de Câncer, o que foi dito não ser necessário pela jovem diva. Máscara da Morte então volta com passos decididos, e joga o despacho dentro do salão.

-Orfeu já está morto. Eu mesmo o matei. –dizia o italiano.

-Você matou Orfeu? – Ares não acreditava, pois Orfeu era um cavaleiro de prata com o oitavo sentido desperto, era praticamente impossível derrotar um cavaleiro de ouro sem estar com ferimentos, a batalha entre os dois deveria ser catastrófica.

-Sempre subestimam minhas habilidades. Poderia dar conta de você, Grande Mestre, mas isso não vem ao caso. –diz o cavaleiro de Câncer com arrogância.

-Ora seu... –Ares estava revoltado, ele mesmo poderia matar o cavaleiro de prata, e se o podia fazer sem ter danos mais sérios, Orfeu sobreviveria de alguma maneira por pelo menos um golpe, o que revelaria sua identidade.

-Não se preocupe, Ares. Ele é bastante espirituoso. –Ares tentava se recompor mentalmente, pois esse pico de instabilidade era a brecha que Saga usava para aparecer, mas tinha alguma coisa na voz de Eris que parecia mais uma de suas manipulações... –Acho então que proporei uma tarefa ao seu nível. Matar o mestre Ancião.

O ar parece parar, os estômagos gelam, o corpo estremece só nas duas palavras que faziam referência àquela pessoa. A verdadeira lenda, um dos poucos mitos vivos entre os cavaleiros atuais. Contam-se lendas de até cem anos atrás, e outras histórias não confirmadas que datam mais de duzentos anos. E todas apontam, mesmo que vagamente, que o Mestre Ancião é o cavaleiro de Libra, a armadura perdida durante anos, desde a última guerra contra Hades, acontecida há 243 anos.

Claro que poderiam ser apenas boatos, poderiam ser especulações e meramente histórias, mas era isso que essencialmente eram os cavaleiros de Athena. Todos eles eram uma lenda, e o Mestre Ancião talvez fosse a maior delas, tirando a vinda de Athena na terra, mas não ficava muito longe.

-Esta bem, finalmente vou poder brincar! –Máscara da morte não tremeu, nem muito menos gaguejou. Em alguma parte ele saberia que poderia de alguma maneira insana se redimir e sai sem ao menos fazer reverência aos seus superiores. Afrodite pede desculpas pelos atos do cavaleiro de câncer, e se retira.

Ares e Eris observavam aqueles dois cavaleiros se retirando, dos quatro que passaram ali naquele momento, eles eram aqueles que serviam ao senso de justiça de outros porque não acreditavam no seu próprio senso de justiça, com segredos que atormentavam suas almas, talvez das dozes casas, aqueles fossem os únicos que o seguiriam sem mentiras.

Talvez...

*******

Há 19 anos atrás...

O Salão do Grande Mestre estava cheio, com os poucos cavaleiros que havia aquela época, na época em que o Grande Mestre regente do Santuário era Shion. Todos ali eram algum tipo de guerreiro de Athena, ou no mínimo ligado a eles, mas isso ainda era raro em eventos desse tipo, ter os dois únicos cavaleiros de ouro que existiam no momento.

Um deles era Aioros, o cavaleiro da casa de Sagitário, um jovem de cabelos castanhos bem cortados porem sempre revoltos. Sua armadura era uma das mais impressionantes do Santuário, a única com asas douradas. Sempre com um sorriso no rosto e uma face amigável, apesar da pouca idade que exalava, tinha passado também por muitas coisas, coisas que amadurecem pessoas mais cedo. Seu dever era atuar como agente externo do Santuário, mandado para missões que somente um cavaleiro de ouro poderia sobreviver, e procurar potenciais cavaleiros.

E o outro era Saga, o cavaleiro de ouro da casa de Gêmeos, um jovem com longos cabelos azuis portando a armadura de Gêmeos que lhe dava um porte impressionante de realeza. O geminiano tinha um olhar gentil, mas sempre uma face muito séria. Sua missão era defender o santuário de qualquer ameaça, ele era a defesa absoluta de todo o santuário, já que era o único cavaleiro de ouro fixo.

Saga e Aioros eram amigos apesar de tudo, e nenhum deles tinha remorso de seus deveres. Aioros adorava explorar o mundo, adorava as pessoas e se sentia sufocado preso em sua casa zodiacal, em seu próprio pensamento, acreditava que para proteger a humanidade tinha que conhecê-la e amá-la de verdade. Já Saga amava o Santuário, pois aquele era seu mundo, seu lar; seu único remorso foi ter dado a pena de morte para seu irmão gêmeo, Kanon, que tramara um plano que nem ele mesmo queria lembrar, mas que sempre ecoava em sua cabeça. A desculpa que ele dera para o sumiço do irmão era uma doença que o matou.

Tanto que eles especulavam sobre como seria sua vida quando se tornassem mais velhos. Aioros desistiria de ser cavaleiro apenas para ser pai de seus filhos e marido de sua mulher, que já estava grávida de seu primeiro filho. Aioros adorava crianças, inclusive seu irmão mais novo que tinha um potencial incrível para ser um cavaleiro de prata e quem sabe um de ouro. E Saga seria o novo Grande Mestre, pois o velho Shion já avisara que a senilidade estava chegando e que sua vida estava chegando ao fim, afinal ele possuía uma idade quase que incalculável para eles.

Havia também quatro cavaleiros de prata, veteranos de batalhas que apareciam esporadicamente, os quais eram Maya de Sagitta, Ian de Escudo, Kraysto do Cruzeiro do Sul e Jagga de Orion, o último era considerado um dos cavaleiros mais fortes para a sua casta, era possível que despertasse o sétimo sentido. Os quatro foram promovidos à guarda pessoal de uma única mulher.

Aquele festejo para os cavaleiros era para comemorar a vinda de Athena para a Terra. E no trono que era posse de Athena estava uma mulher vestida como uma sacerdotisa, e grávida de seus sete meses. Estava feliz por trazer a reencarnação de Athena à Terra, mas achava mais que aquela comemoração era para ela do que para a criança. Estava feliz também por outro motivo, mas não ousava pensar próximo ao Grande Mestre.

-Atenção. –Dizia Shion com sua voz poderosa e única, apesar da avançada idade. –Estamos aqui para festejar a aproximação da vida de Athena para a terra e por ela vir de uma de nossas sacerdotisas. – Todos os cavaleiros levantavam a taça de vinho. –E venho aproveitar também para proclamar quem será o meu sucessor.

Saga estava esperançoso, seu trabalho seria reconhecido por ter a fama local de “homem santo” e Aioros ficava feliz antecipadamente pela conquista do amigo. E todos os outros olhavam para o Grande Mestre, inclusive os oficiantes que serviam os comes e bebes, e mesmo os soldados que faziam a segurança do local.

-Aioros se tornará o novo Grande Mestre quando eu partir para o lado de meus companheiros de batalha. –dizia Shion, levantando a taça. E todos levantaram suas taças, exceto Alana que não possuía taça e os dois cavaleiros de ouro que estavam perplexos...

2 comentários:

  1. Imagino o choque desses dois hmm...

    Aioros provavelmente nem queria, então até mesmo ele não acreditou no que ouviu e não concordou ^^

    Provavelmente foi um teste do Shion, por que basicamente fizeram a mesma coisa com o Aspros hmm...

    Mas como isso é um chute, vou esperar pra ver, ou melhor, ver pra confirmar XD

    Indo pro 10 ^^(Ê, tô quase te alcançando \o/)

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  2. Pois é... Aioros nunca quis ser líder de nada, queria apenas uma vida para ele. O proposito de Shion vão ser revelados ainda...

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