Alma Nova 18.2 - Uma Visão Turvada por Lágrimas

Okko olhava para trás e via um vale de estacas com diversas armaduras com seus usuários,
todos a mais tempo que ele poderia imaginar. Reconhecia algumas, pelo incrível traços dos
lemurianos, mas havia outras armaduras também. Que não pareciam fazer parte do contingente de
Athena. Era um verdadeiro cemitério a céu aberto, um campo de batalha que parecia não ter
acabado. E a pergunta correu em sua mente, porque um campo de batalha aqui... e percebeu que
perdeu o foco da luta e voltou a atenção para o inimigo.

Só não foi atacado, pois Shiryu estava em confronto direto com o cavaleiro de prata.

Atacava com o punho fechado, visando órgãos internos, no mesmo estilo de luta que Dohko o
ensinará, e fazia lembrar muito bem o estilo de Dragão Negro também. Apesar de atacar Tarantula,
a superioridade do cavaleiro de prata era evidente, tanto em tática de combate, vigor físico e o fato
de possuir uma armadura. Parando de ver as desvantagens em que estava e sorriu, e avançou
atacando.

Um simples ataque direto que visava o flanco, Aracne percebeu a investida e bloqueou o
ataque. Que foi a brecha em que Shiryu acertou a costela do adversário, o qual sentiu o ar sair dos
pulmões com um grito. E preparou para ataca-lo, e recebeu no flanco recém exposto um golpe do
outro cavaleiro. Era impressionante que o movimento era praticamente o mesmo. Fazendo o
cavaleiro ter dois focos de atenção.

Todos os golpes eram bem colocados, e com uma cadência ritmada que ao receber o golpe
de Shiryu, do outro lado vinha o golpe de Okko. Se fosse um adversário menos experiente, iria
acabar sucumbido aos ataques simultâneos. Só que Aracne estava acostumado a lutar em
desvantagem, e se adaptou rapidamente a sequência de golpes, usando o lado direito para defender
de Shiryu e o esquerdo para se defender de Okko. O que deixou ambos surpresos, logo, em alguns
golpes depois, Aracne voltava a dominar a luta. Usava as partes das armaduras para se proteger,
tanto dos braços quanto as das pernas. Causando danos e lesões aos punhos nus dos adversários.
Em um movimento mais rápido que os olhos dos membros da resistência puderam
acompanhar, o cavaleiro de prata abaixou com o tronco rente ao chão, fazendo que os dois socos
diferidos pelos seus oponentes se chocassem. E no segundo seguinte, impulsionou-se para cima.
Okko tentou acompanha-lo com os olhos, os quais foram ofuscados por um momento pelo
sol. Shiryu não sofria de tal mal por não ter visão e apenas ver o fluxo de cosmo. E atirou-se para
derrubar o cavaleiro de Dragão, para salva-lo do movimento seguinte. O cavaleiro de Aracne havia
descido com um chute que iria matar um deles, se tivesse acertado, mas não houve tempo de
espera.

Ao cair, Aracne com o mesmo ponto de apoio do impacto foi em direção aos cavaleiros
caídos. Okko, apesar ofuscado ainda, empurrou Shiryu para o lado e levantou, atacando também.
Geralmente, usaria seu escudo, mas neste caso a melhor defesa era o ataque. E ambos os socos se
chocaram, o cavaleiro de Dragão sentiu todas as articulações, das falanges do dedo até os ombros
doeram com o impacto, e agradecia por seu braço ainda estar lá.

O cavaleiro de Tarantula esperava o ataque do outro, mas ele ainda estava caído no chão
com uma farta poça de Sangue. E percebeu que o cavaleiro que o havia atacado se distraiu com o
amigo. O que todos ali sabiam que era uma péssima escolha, e um segundo soco foi desferido. Mas
apesar da distração, Okko fez o mesmo, evitando o impacto com outro. E seu outro braço também
reclamou das dores. E em um movimento, o moreno teve seus pulsos pegos, e recebeu chutes
velozes no abdômen, peito e rosto.

E o soco de Shiryu veio separar, os dois cavaleiros se separaram. E novamente, ele caia
ajoelhado com a mão no peito. Com uma dor alucinante que vinha com mais uma golfada de sangue.
Okko não entendia o que aconteceu com Shiryu, mas sabia que tinha que dar tempo para ele se
recuperar. E novamente avançou para cima do cavaleiro do santuário, mas sua concentração de
dispersava com a saúde do amigo recém feito.
Atacando novamente com soco de punho fechado, havia responsabilidades naqueles
golpes, a vida de Kiki e de Shiryu dependia dele além das armaduras de Isaak e Thouma, que
estavam com Pandora protegendo Hana. Havia o peso de ser o discípulo único do Mestre Ancião.

— Imbecil. – Aracne riu e atacou no peito, com um golpe bem alocado no coração. O
ponto fraco de qualquer cavaleiro de dragão e perdeu a consciência, sendo tragado pela escuridão.

********
Okko estava realmente em um breu, acordará em um lugar que apenas conhecia o negro e
cinza como cores. Forçando a visão, via que aquele lugar não se parecia com Jamiel, mas era lhe
familiar. Algumas rochas bem polidas, como se estivessem na beira de um rio com outras que
lembravam rochas sedimentares, encontradas geralmente em montanhas. Mas um detalhe lhe fez
entender que lugar era aquele, apesar de achar que era improvável.

Pequenos fragmentos de Oricalco, que caiam do céu. Onde a armadura de Dragão dormia
no fundo da cachoeira, lhe dando uma extrema solidez. E finalmente percebeu a cachoeira, aquele
local era como se fosse uma pintura em tamanho real do local. Só que sem vida, e tremeu. Que lugar
bizarro era aquele? Estava morto o que aconteceu?

— Aqui é o limiar da sua consciência, Okko. – Uma voz ecoava de todo o local.

— Onde você está? Quem é você? – Okko já se colocou na posição de combate.

— Não reconhece a minha voz? – dizia a voz que não lhe parecia estranha.

— Shiryu?! – A voz era de Shiryu, mas o tom era diferente. Havia malicia e um pouco de
desprezo, coisa que não existia no timbre do discípulo de Mu.

— Quase, mas errou. – Saia de dentro da cachoeira que era um cavaleiro de dragão. Só
que sua armadura era negra, com olhos com um fundo azul escuro que fazia lembrar o céu negro de
uma meia-noite e com sua íris negra que lhe dava a impressão de profundidade. – Já esqueceu de
mim?

— Dragão Negro?! – O cavaleiro de Dragão via seu antigo adversário que servia a Jango.
Que padeceu em seus braços desejando ser um verdadeiro dragão.- O que você está fazendo aqui?
Ou melhor, onde estamos?

—Não deu para perceber ainda? - Dragão Negro tinha um ar didático e com uma breve
ironia. – Estamos no limiar da sua consciência, onde você e sua armadura “se unem”. Geralmente a
mente do cavaleiro traz um lugar familiar ou agradável, e ao que parece você escolheu seu lugar de
treinamento.

— Sim, aqui é a representação perfeita onde eu treinei para obter a armadura de Dragão. -
dizia Okko. – Mas não é isso que me incomoda, significa que eu então estou inconsciência e deixei
Shiryu contra um cavaleiro do santuário. Ele vai acabar morrendo se eu não tenho tempo para
conversar.

— Não lhe trás certa estranheza eu ser idêntico ao tal Shiryu e não a você? - a pergunta
ecoava um pouco no coração do moreno desde que o encontrou. – Já que nós cavaleiros negros
somos nascidos para vencer e substituir nossas versões “brancas”.

— Então... – As palavras de Okko doeram para sair. – Significa que eu não sou o real
cavaleiro de Dragão?

— Não sei exatamente dizer. – Cruzava os braços para pensar. – Talvez seja alguma
artimanha das estrelas ou os deuses brincando com o destino de todos.

— Responda-me, se eu não sou regido pela constelação de Dragão, o que eu sou
realmente? – Seus punhos estavam tão fechados, que um fio de sangue descia dos punhos de Okko.

— Não sei que constelação o rege, mas sei o que você mais um tigre do que um dragão. E
não faço a menor ideia o porquê a armadura lhe escolheu, mas como eu disse quando eu tinha um
corpo físico, estou aqui para lhe tornar um Dragão de verdade, ou quem sabe um tigre mais
poderoso. Pois foi o caminho que descobri para ser parte do cavaleiro de Dragão. Basta apenas
você decidir o que vai fazer com essa informação e com o meu poder.

Okko respirou, forçou o punho mais uma vez e por mais uma vez escolheu a decisão de um
rebelde.

— Lutar. Sempre. - A resposta veio com um sorriso selvagem.
E aquele local que era sem vida e tinha no máximo cinza como cor, ganhou odor de água
com terra, o forte som da cachoeira que urrava a força da natureza e a cor vivida que se
apresentava. E a vida tomava conta de tudo.

*****

Shiryu bloqueava os ataques da maneira que podia. Sem Okko, e deixando Kiki em
segurança fazia o lutar com grande dificuldade. Seu coração estava no limite, a luta com Misty de
Lagarto o fez alcançar um nível que seu coração aguentou com milagres. Entretanto, o coração dele
enfraqueceu. E talvez aquela fosse sua última luta como guerreiro, e talvez simplesmente fosse a
última luta que ele faria por Athena. E sua missão era vencer aquele cavaleiro de prata, mesmo que
o preço fosse alto demais.

A luta para Aracne estava simples, literalmente sentia-se uma aranha com uma presa na teia.
Não valia apena terminar aquela diversão que era ver um cavaleiro se matar para vencê-lo sem
esperança nenhuma. E não atacava levemente, e fazia questão em atacar com socos bem
direcionados ao coração do aprendiz de Mu.

O aprendiz tentava bloquear os ataques mais graves, mas de três, um o acertava em cheio;
e o fazia soltar uma golfada de sangue, sua consciência tonteia e o corpo para de responder
levemente. Se fosse usar o Cólera do Dragão, teria que ser certeiro, pois seria o seu último.
Qualquer golpe mais forte que isso. Seria ineficaz, pois seu corpo não resistiria nem ao início do
golpe. Mas se não fizesse nada, acabaria morrendo também.

E sem conseguir reagir, acabou recebendo um chute no estomago que finalmente o fez cair.

E viu seu mundo rodar, mas não perdeu a consciência, mas apenas ficou no chão tentando criar um
plano de ação sozinho. Contava com Okko para vencê-lo.

— Vocês dois são muito sem graça. Talvez aquele moleque seja muito mais poderoso que
vocês dois juntos, e se não for simplesmente foi arrancar a cabeça dele na sua frente. – Aracne riu
em uma vitória certa.

E a fúria do Shiryu começou a subir. Uma coisa que nunca foi vista, já que ele era sempre
calmo e gentil. Mesmo na pior das situações, mas ameaçar Kiki, que era seu companheiro de
treinamento e praticamente seu irmão era inaceitável. A explosão de seu cosmo, fazia seus longos
cabelos levitar com o fluxo. E um Dragão Esmeralda nas suas costas começou a aparecer. A
cosmoenergia liberada dava a mesma sensação de que um dragão estava prestes a bater suas asas.

— Resolveu lutar, finalmente?! – O cavaleiro de Tarantula começou a levar o cavaleiro sem
armadura.

— Você vai pagar por ameaçar meus amigos, e a todos os que o me importam. – A raiva
de Shiryu finalmente parecia alcançar um limite que parecia quase perder o controle. – Está na hora
de você pagar por tudo que você vez.

Aracne tomava também a posição de combate levada a sério e começava a elevar seu
cosmo. Que não chegava a ser o mesmo do seu oponente, mas era bem próximo.

— DRAGÃO NASCENTE!!!

— TEIA DA TARANTULA!!!

******

O golpe de Shiryu era assustador, possivelmente a energia dispersada por ele seria capaz
de destruir todo o local. Um dragão esmeralda iria de encontro ao seu inimigo. O problema que
Aracne lançou uma teia que envolvia o seu golpe e o dissipada, e não adiantava a cosmo que
lançava, e sua morte seria em vão. Até que seu coração deu uma batida mais forte e única que o fez
cair e parar de lançar seu golpe. E novamente caia no chão.

— Imbecil – Aracne observou o adversário caído. – Minha técnica principal absorve o
cosmo alheio e me da uma carga maior de poder. Que no caso transferi para a minha armadura,
agora os danos que vocês causaram até agora. Vocês realmente são muito imbecis.

— Acha imbecil lutar pelo que acredita, Aracne?! – Shiryu estava com alguns vasos
sanguíneos arrebentados, havia várias lacerações, vários hematomas e sangramentos por todos os
lugares.

— Acho quando é inútil. – O cavaleiro de prata ousava a ser honesto. – Se tem uma
missão, sua vida tem que ser essa missão, nós lutamos assim. Nunca sabendo qual é a última.

— Você tem razão, mas não me acho inútil e nem imbecil perdendo. – Shiryu sentia que
aquelas seriam as suas últimas palavras. Sabia que ia morrer e queria pelo menos deixar a semente
que a Athena que ele defenderá era falsa. – Tudo tem uma razão, mesmo que não saibamos o que
as estrelas nos guardam, nossa passagem na terra tem sempre um sentido.

De repente, antes que pudesse falar algo, uma explosão de cosmo energia era assustadora.

O próprio Aracne se assustou, pois não conhecia nenhum cavaleiro de prata com tal poder.
Perguntou-se quem teria poder para tanto, seria o tal Mu que era o senhor de Jamiel que chegou.

Porém olhando diretamente para o foco, via Okko se levantado assim como Shiryu, só que um
dragão purpura com o rugido de tigre parecia emanar do cavaleiro de Dragão.

Apesar de não visto, um tigre aparecia nas costas de Okko, e logo em seguida um dragão
negro, feito o que Shiryu tinha, circundava o tigre, numa aparente proteção. E por um instante,
Aracne duvidou de sua vitória.

— ARACNE!!! – Okko gritava e parecia que havia uma outra voz consigo. – Vamos
acabar com isso agora!

Devido aquele poder assustador, o cavaleiro de Tarantula também começava a elevar seu
cosmo. Apesar de tudo, sua técnica era tanto defensiva quanto ofensiva. Absorveria o cosmo
daquele ataque e o retroalimentaria, até o ponto que o próprio golpe de de Okko alimentaria a teia,
usando seu próprio poder contra ele.

Mas dessa vez, Okko não fechava o punho para atacar, como das outras vezes. Estava de
mão aberta como se a própria fosse uma garra de um grande felino. O cosmo antes racional, parecia
selvagem e assustador, tudo nele parecia ter mudado. Era se como antes, ele não lutasse
completamente livre de suas amarras éticas. Se comportava como deveria, como um tigre.

— GRANDE FURACÃO DO TIGRE!!!

— TEIA DA TARANTULA!!!

As rajadas de vento saiam como um cone que tinha como vértice o punho de Okko. As
lâminas de vento chegavam a cortar algumas rochas do local, mas os cosmo em forma de teia de
Aracne possuía uma área maior, como um fluxo brilhante de cosmo, que absorvia boa parte do
golpe, mas que perdia poucas fibras. Aracne viu que apesar de poderoso, seu oponente iria cair
uma hora.

E Okko rugiu fazendo seu cosmo aumentar assustadoramente. Mais fios da teia de cosmo
foram rompidos, mas a estrutura principal do golpe ainda sim estava integra ainda. Aguentaria o
fluxo de cosmo, se apenas seu adversário fosse o moreno. E mesmo assim, não teria tanta certeza.
Perguntou a si mesmo se não havia outras cartas na manga aquele cavaleiro.

E havia, pois Okko não lutava sozinho. Dragão Negro estava lá para lhe ajudar. O mesmo
Dragão tatuado nas costas dele, agora movimentava-se como se tivesse vida por seu braço
esquerdo. E não percebera, mas a parte branca do seu globo ocular esquerdo começava a
escurecer também. E viu um cosmo mais sombrio acumular onde residia o dragão tatuado e um
novo grito surgiu da garganta dele.

— PUNHO DO DRAGÃO NEGRO!!!

E um segundo cosmo, ao contrario do primeiro que era selvagem. Esse era assassino, o
sentimento que ele causara era como houvesse uma faca entre suas costelas trazendo um corte fino.
Só que ao contrário do sentimento que esse golpe trazia, o ataque era direto como um dragão
querendo seu alimento. Atacando-lhe com a boca aberta, e o vendaval do tigre, antes que se dirigia
ao certo da teia, agora abria caminho para o segundo golpe, destruindo totalmente a teia.
E Aracne não teve tempo de gritar com o golpe o devorou.

*****

Shiryu ainda mantinha a clareza da consciência, respirava mal, o que significava que a poeira
caia por todo local. Tropeçou em um dos esqueletos que tinham como seu descanso o precipício ao
seu lado. O poder do cavaleiro do Dragão era realmente impressionante. Ao se levantar e ver que
venceu aquele embate, e sentia a uma certa distância o cosmo da armadura de tarântula destruída,
como se fosse dívida ao meio, pois absorver tanto cosmo foi demais para a mesma, forçada ao
limite. Seria mais uma armadura a ser restaurada pela linhagem lemuriana.

E coração reclamou, e numa das ironias da vida, aquele dragão nascente levou o que
restava da sua saúde. A luta com Misty o levou ao limite, e talvez se nunca mais lutasse, ele teria
uma vida como um auxiliar. Mas nunca desejou essa vida para si. E encontrou Okko parado no
mesmo local de onde aplicou o golpe. Viu pelo fluxo de cosmo que seu corpo estava destruído com
a tensão dos golpes que lançou. O trauma muscular era enorme, mas estava vivo e iria se recuperar
fácil. E sorriu.

E novamente o coração reclamou, junto vinha uma golfada de sangue forte demais. Seu
coração sustentava uma batida sem ritmo forte que ele não teria muito tempo de vida. O Dragão
Nascente fazia até mesmo o sangue do usuário fluir ao contrário. Diziam que esse o teste para ser o
cavaleiro de dragão era fazer a cachoeira de Rozan fluir ao contrario para despertar a armadura de
Dragão para ela ver se quem a convocará era digno. E Okko realmente era digno. O discípulo de
Mu caminhava, superando a barreira que era seu próprio corpo até o amigo.

— Tem como me ajudar? – Okko falava desabando nos braços amigos. Seu corpo agora
não conseguia se sustentar. E apensar de estar à beira da morte, ele não o deixou cair.
O cego o jogou por cima do ombro e o levou junto consigo pelo fino caminho feito para ele.
Já que ele não possuía os dons de teleporte de Mu ou mesmo de Kiki.

— Você o venceu. Eu nem acredito. – Seu corpo ainda estava saudável, mas era seu
coração que não parava de acelerar, prestes a falhar, mas iria garantir que seu amigo vivesse e não
iria cair.

— Foi graças a você. – Só a boca e os olhos de Okko conseguiam fazer algo. Se sentia
uma rocha, havia perdido até mesmo o tato. Não sentia o amigo carregando-o – Foi uma rachadura
no braço dele que fez a armadura se desfazer. Não sei o que você fez enquanto eu estava
inconsciente, mas funcionou.

E Shiryu sorriu, e notou que sua morte não seria em vão. E torcia que sua vida não seria
apenas aquilo, esperava não morrer quando acabasse de atravessar a ponte. Ao chegar, pousou
Okko no chão de costas para baixo. Kiki chegou chorando, assim como Shiryu, só que menos que
ele, e o abraçou chorando.

O jovem lemuriano quis dizer muitas coisas, queria dizer o quanto ele o considerava um
irmão, o quanto ele era melhor consertando armaduras, o quanto ele queria ficar a sua sombra para
sempre. Mas Shiryu sabia disso, e tudo que podia fazer era era despedir-se, mas não conseguia
dizer nada. Não queria ver seu irmão morrer.

— Vá ao encontro de Mu. – Dizia o cego para o ruivo e passou a mão com um carinho
fraterno.

Deu dois passos para trás e viu pela última vez seu amigo. Aquele homem poderoso que era
o exemplo que todo cavaleiro deveria seguir e sumiu com um teleporte.

— Pode me dizer o que está acontecendo? – Dizia Okko olhando a cena de maneira
invertida. E não entendia o que estava acontecendo.

As armaduras de Pegasus, Cisne e Dragão estavam em suas formas base, percebia-se que
estavam sem o brilho que estavam acostumados de ver, reluzentes e poderosas. Elas pareciam os
próprios cavaleiros sem as armaduras. Qualquer um teria tristezas ao ver as armaduras naquele
estado. E havia várias ferramentas espalhadas pelo chão, que pareciam mais parte de alguma
armadura.

— Não sei se você sabia ou não. Tenho um problema cardíaco, além de ser cego. - Ao
falar, começava a pegar as ferramentas e o oricalco – Minha mãe morreu abandonada, esperando o
meu pai. Até que aos meus 8 anos, mestre Mu me adotou. Ele me levou em alguns médicos e
curandeiros, mas o meu coração era mais fraco do que o normal para um humano. Que eu tinha
tudo para viver bem como um humano, um auxiliar do santuário. Mas não para um cavaleiro.

— Mas é você o verdadeiro cavaleiro de Dragão, você que deveria usar a armadura, e não
eu. – Okko dizia ainda não assimilava o que estava acontecendo.

— Não foi o que as estrelas decidiram. - A dor no coração de Shiryu atacava mais uma
vez. – Quando decidi lutar contra Misty, pensei em morrer como um cavaleiro, só que isso não
aconteceu. E não aconteceu também nessa luta. Mas vou continuar vivendo e lutando como um
dragão, não incompleto agora.

Okko já ouviu um discurso desse tipo, e as voz chegava a se sobrepor a de Dragão Negro
em sua cabeça, pois foram suas últimas palavras. E finalmente entendeu o que estava acontecendo,
ele iria morrer. E seus olhos começaram a lacrimejar, só que ainda sim as lagrimas não desceram.

E rapidamente, seu amigo rasgou os pulsos e banhava a armadura de dragão com o seu
sangue.

— O que você estava fazendo? – Okko já gritava desesperado com a força que lhe
sobrava, que não era muita.

— As armaduras também, de alguma maneira estão vivas. E nada nesse mundo é
conseguido sem sacrifício. Eu vou morrer de qualquer maneira, usando a minha vida para consertar
sua armadura ou não. – Havia um sorriso ao dar um proposito para a sua morte. – Não me
arrependo e lhe garanto que seu escudo nunca iria quebrar e nem seu punho. Só se você bater um
contra o outro. E sorriu, esvaindo sua vida em prol de um amigo.

E tudo que Okko podia ver era seu companheiro morrer, a visão turvada pelas lagrimas que
antes ele prendia.

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